
Uma Estratégia Quantitativa que Une Estatística e Lucro Consistente
Em um mercado cada vez mais competitivo, onde algoritmos e inteligência artificial dominam as negociações, surge uma estratégia que combina matemática, estatística e lógica de mercado: o Pairs Trading, ou trading por pares. Criada originalmente nos laboratórios de Wall Street, essa abordagem quantitativa se tornou uma das técnicas mais respeitadas no universo do trading estatístico – especialmente por sua capacidade de gerar retornos estáveis com risco controlado.
Neste artigo, você vai entender o que é o Pairs Trading, como ele funciona na prática, por que é usado por grandes fundos quantitativos, e como começar a aplicá-lo, mesmo com poucos recursos.
No próximo artigo da série, você aprenderá a parte prática, com código Python, gráficos interativos e teste de cointegração entre ativos – passo a passo.
O que é Pairs Trading?
O Pairs Trading é uma estratégia de arbitragem estatística que explora a relação entre dois ativos historicamente correlacionados.
A lógica é simples: quando o preço de um ativo se desvia demais em relação ao outro, fugindo do padrão histórico, o trader vende o ativo sobrevalorizado e compra o subvalorizado, apostando que, com o tempo, os preços voltarão à média.
Essa abordagem é um dos pilares do que chamamos de Market Neutral Strategies, ou estratégias neutras ao mercado, ou seja, não dependem da direção geral (alta ou queda) para gerar lucros.
Em vez de prever se o mercado vai subir ou cair, o Pairs Trading busca equilíbrios temporariamente rompidos. Ele se baseia em uma hipótese estatística:
“Se dois ativos compartilham uma relação de longo prazo, desvios dessa relação tendem a se corrigir.”
Como Funciona na Prática
A aplicação do Pairs Trading segue quatro etapas principais:
1. Seleção de Pares Cointegrados
O primeiro passo é escolher ativos que possuam uma relação estável ao longo do tempo.
Embora muitos traders iniciantes usem apenas a correlação, profissionais quantitativos buscam cointegração, uma medida estatística mais robusta que identifica se dois ativos compartilham um equilíbrio de longo prazo.
Em outras palavras: mesmo que os preços individuais oscilem de forma independente, a diferença entre eles tende a retornar a um valor médio constante.
Essa é a essência da reversão à média no Pairs Trading.
Os pares mais promissores geralmente pertencem ao mesmo setor econômico, possuem modelos de negócios semelhantes e sensibilidade parecida a fatores macroeconômicos.
Exemplo clássico no mercado brasileiro:
- PETR4 e PETR3 — ações preferenciais e ordinárias da Petrobras.
- ITUB4 e BBDC4 — dois grandes bancos com dinâmicas semelhantes.
Esses pares historicamente mantêm relações de cointegração consistentes, tornando-os ideais para análise e teste.
2. Construção do Spread
Após a seleção, calcula-se o spread, que representa a diferença ajustada entre os preços dos ativos do par.
Para isso, utiliza-se uma regressão linear, onde um ativo é explicado em função do outro, resultando em um coeficiente β (beta) que indica a proporção entre eles.
A fórmula básica é:
Esse spread é o coração da estratégia. Ele mostra quando há desequilíbrio temporário entre os ativos, isto é, quando um está relativamente caro e o outro barato.
A partir dele, são definidos os pontos de entrada e saída das operações.
3. Sinal de Entrada e Saída
Com o spread calculado, aplicamos o z-score, que mede quantos desvios-padrão o spread está afastado da sua média histórica.
A fórmula é:
A lógica operacional é simples e baseada em reversão à média:
- z > +2: o ativo A está caro → vende-se A e compra-se B.
- z < -2: o ativo A está barato → compra-se A e vende-se B.
- z ≈ 0: o spread retornou ao equilíbrio → encerra-se a posição com lucro.
Esses limites (geralmente ±2 desvios-padrão) podem ser ajustados conforme o perfil do trader e o comportamento histórico do par.
O objetivo é capturar o movimento de correção sem exposição direcional ao mercado.
4. Gestão de Risco e Backtest
O sucesso de uma estratégia quantitativa depende menos da sorte e mais da robustez estatística.
Por isso, o backtest (teste histórico) e a gestão de risco são etapas indispensáveis.
Entre as principais métricas utilizadas estão:
- Half-life: tempo médio necessário para o spread voltar à média.
- Sharpe Ratio: mede o retorno ajustado ao risco.
- Drawdown máximo: indica a perda máxima durante o período de teste.
- Alavancagem ideal: ajusta o tamanho das posições para manter a neutralidade.
Esses indicadores permitem determinar se o par escolhido é estável, lucrativo e sustentável ao longo do tempo.
Além disso, é fundamental incluir custos operacionais, corretagem e slippage no backtest, pois mesmo pequenas variações podem comprometer a rentabilidade em estratégias de alta frequência.
Leia também: VaR e CVaR: Análise de Risco de Portfólio com Python
Por Que o Pairs Trading é Tão Utilizado por Fundos Quantitativos
Grandes gestoras como Renaissance Technologies, Citadel e Two Sigma utilizam estratégias similares há décadas.
O motivo é claro: o Pairs Trading não depende da direção do mercado, apenas da relação entre ativos.
Isso o torna ideal em momentos de alta volatilidade, quando o mercado sobe e desce sem direção clara.
Outras vantagens incluem:
- Baixa exposição direcional (hedge natural);
- Alto controle estatístico dos riscos;
- Fácil automatização via algoritmos;
- Aplicabilidade global (ações, ETFs, moedas, commodities).
No Brasil, com o avanço das plataformas de dados e APIs como yfinance e tradingcomdados hoje TCD Tech, essa técnica vem ganhando espaço entre analistas quantitativos e investidores profissionais.
Pairs Trading x Correlação Tradicional
Muitos iniciantes confundem correlação com cointegração.
A correlação mede apenas movimentos conjuntos de curto prazo, enquanto a cointegração indica uma relação equilibrada no longo prazo.
Por exemplo, duas ações podem ser altamente correlacionadas por coincidência (ex.: duas empresas de setores diferentes em alta simultânea), mas não cointegradas, ou seja, sem vínculo estatístico real.
Somente pares cointegrados permitem explorar reversão à média de forma confiável.
Desafios e Cuidados
Apesar do potencial, o Pairs Trading não é uma fórmula mágica.
Entre os principais riscos estão:
- Ruptura da cointegração (mudanças estruturais entre os ativos);
- Custos operacionais e corretagem;
- Slippage (diferença entre preço esperado e executado);
- Risco de modelagem (uso de parâmetros inadequados).
Por isso, o backtesting robusto e o monitoramento contínuo são indispensáveis.
Aplicações no Mercado Brasileiro
O Pairs Trading pode ser aplicado na B3 (Bolsa de Valores Brasileira) com ações como:
- PETR4 x PETR3
- ITUB4 x BBDC4
- VALE3 x BRAP4
- ABEV3 x CCRO3
Além disso, é possível adaptar a técnica para Fundos Imobiliários (FIIs), ETFs ou até pares de criptomoedas, desde que haja dados históricos confiáveis.
Avanço: Implementando Pairs Trading com Python
O poder do Pairs Trading moderno está na automatização.
Com poucas linhas de código em Python, é possível:
- Baixar dados históricos com yfinance;
- Calcular beta, spread e z-score;
- Testar cointegração com
statsmodels; - Criar dashboards interativos com Plotly.
No próximo artigo, você aprenderá passo a passo como construir um sistema completo de Pairs Trading, com gráficos de spread, sinais de compra e venda, e análise de lucro mensal, ideal para quem quer profissionalizar sua abordagem quantitativa.
Conclusão aos Leitores
O Pairs Trading é mais do que uma técnica de arbitragem: é um laboratório vivo de estatística aplicada ao mercado financeiro.
Ele combina ciência de dados, teoria econômica e gestão de risco, pilares de qualquer trader moderno.
Para quem está começando, entender os conceitos de cointegração, regressão e z-score já é meio caminho andado.
Para quem já opera profissionalmente, automatizar a estratégia pode abrir novas oportunidades de lucros consistentes e controlados.
O futuro do mercado financeiro é quantitativo e automatizado, e o Pairs Trading é uma das portas de entrada mais elegantes e eficazes para esse universo.
Próximo artigo: Pairs Trading na prática
No próximo artigo, exploraremos como construir um sistema completo de Pairs Trading em Python, “para ser bem sincero com você – eu ralei pacas neste código”, com coleta automática de dados, cálculo de cointegração, geração de sinais e criação de um dashboard interativo para análise do resultados.
Fontes e Referências
A Practical Introduction to Pairs Trading
Otimização de Portfólio em Python: Foco na Fronteira Eficiente de Markowitz




